segunda-feira, 21 de abril de 2014

Janela para o aquário

Conhecem aqueles filmes em que alguém tem uma vista indiscreta para uma janela do prédio da frente? Pois eu sou uma dessas pessoas. 
Há uma janela que se denuncia no prédio que está a nascente do meu. O edifício está a uma distância de 200m e a janela está um pouco abaixo da minha. Entre nós não existe nada a não ser a altura que nos separa. As árvores estão muito lá em baixo e os pássaros passam rápido, pelo que nada interrompe aquilo que vos vou contar.
Dentro desta janela existe um aquário e de tão grande que é, ocupa todo o cenário a que tenho acesso. É como se se tratasse de um palco em que o único acessório é este reservatório de água, peixes e plantas. 
A actriz chega em minutos. Vem nua, pelo menos da cintura para cima. Pára em frente à janela e consigo perceber-lhe os contornos do peito contra luz. Tem os cabelos ondulados e soltos sobre as costas e quando se dobra sobre o aquário, as madeixas, obedecendo ao gesto, deslizam cobrindo-lhe o rosto.
A luz que vem de cima reflecte o prateado dos peixes. Parecem pirilampos a piscar e a rodopiar na hora do crepúsculo. Pirilampos que nadam em vez de voar. Há um deles que é vermelho, por acaso é o maior. Esse não brilha como os outros, mas é mais rápido.
A protagonista de vez em quando desaparece e por vezes até demora a reaparecer. Parece que brinca com a minha curiosidade, embora nunca se tenha apercebido que ali estou a vê-la. É um espectáculo secreto, sem ensaios ou encenadores, sem bilheteira ou possibilidade de fazer reserva. A atriz actua sem hora marcada, sem palco ou texto, para um público que não lhe vai bater palmas, nem oferecer rosas.
E assim, enquanto como morangos frescos acabados de lavar, pingando água ainda, sacio a fome e a sede, ao mesmo tempo que espio a beleza alheia. Embora tenha a minha preferência definida, tenho de confessar que me delicio a vê-la. Por vezes parece que dança nos seu gestos dengosos. Bravo, penso eu. Bravo! Quase o grito, como se estivesse na plateia.
Imagino quantos cenários destes existem por entre os prédios de Lisboa. Quantos corpos nus são secretamente espiados através das janelas abertas.  Quantos deles inspiram quadros, fantasias e até poesia. 
Talvez hoje deixe a minha aberta. Talvez a Poente seja eu a observada... 

photo byLaycos

sexta-feira, 18 de abril de 2014

Janela para...

Se hoje pudesse abrir uma janela e escolher o que está do outro lado, escolhia ver um campo aberto, coberto por um céu azul limpo e infinito. Um manto de flores do campo, povoado por papoilas saltitantes e margaridas vestidas de noivas, pintalgadas por joaninhas. E se a janela fosse grande, saltava para fora e ia respirar o cheiro da Primavera. Subia para as cavalitas de uma árvore e ficava ali a deixar-me despentear pelo vento. E quando o sol me chamasse, obedecia e deitava-me de costas junto às papoilas, com as mãos atrás da cabeça a servirem de almofada e ficava ali. Ficava a ouvi-lo enquanto se põe ao som da brisa morna do final do dia, pintando o azul de amarelo e laranja.E quando passasse o turno à lua, adormecia. Só de imaginar sinto o maroto do meu coração cheio de vida e energia a puxar-me o sorriso. Não sei porquê, mas isto parece-me uma prendinha da Primavera:)
E tu, já pensaste como seria a tua janela?

terça-feira, 1 de abril de 2014

Dia das mentiras!

Sem saber a que horas abre o teu coração, nem durante quanto tempo permanecerá aberto, arrisco. E a partir de uma determinada hora, acertada com o teu relógio, o meu coração espera por ti.
Tenho esperança que o sentimento caminhe nos dois sentidos, o meu para ti e o teu para mim.
O entusiasmo parece crescer. As conversas sobrevoam as mesas aonde almoçamos e os jardins da cidade convidam-nos a entrar no meio das escapadelas a meio da tarde.
Já reconheço o som grave da tua voz e o cheiro do teu cabelo. O por do sol inventa rasgos de luz laranja no horizonte e a lua interrompe o silencio refletindo-se em ondas prateadas, enquanto a minha mão se aquece na tua.
A noite chega. Os lábios encostados ao ouvido revelam mil e um segredos,
as mãos indicam aonde está o desejo.
Juntos, sem querermos saber, ficamos apesar da falta de promessas.
No dia seguinte a manhã dita a hora de partir.
E de repente o telefone deixou de tocar, já não estacionas o carro ao fundo da rua no fim do dia. A caça terminou e o entusiasmo esgotou-se em duas noites. 
Ficam as emoçoes, a certeza de que tudo é efémero e as expectativas passam do futuro para o passado numa fração de segundo. Como se de repente hoje fosse o dia das mentiras... e tudo não tivesse acontecido!
E agora perguntam, verdade ou mentira:)