terça-feira, 1 de maio de 2018

Ode ao belo que há em Ti.

Hoje acordei com uma sensação de que não vou voltar a ver-te. E muito tempo irá passar até que esta impressão do nosso tudo, afinal não foi mais do que este tempo que acabou.
É tão fácil desperdiçar-me em ti e viver momentos de total rendição à tua beleza feminina. Encontrar caminhos com a ponta dos dedos, pela tua pele branca como a luz e perder os sentidos no teu ventre liso.
Quero manter o calor do teu hálito até perder a paciência. Que morra de fome antes de descolar-me da tua boca. Depois de tudo o que deixei para trás, não posso deixar escapar nada do que tenho teu. Vou beber-te de um trago e até o ar me vai cheirar à ti.
Quero morrer todos os movimentos que me afastam de nós. Apagar todas as portas que se fecham quando sais do quarto.
Quero sentir esta imensidão de sensações que me doem o prazer, até ter a certeza que não perdi nada de ti. Vou rezar pela primeira vez e pedir que as memórias que tenho, se prolonguem mesmo depois de cortares o cordão que nos prende uma à outra.
No teu corpo conheci o meu.
Na sombra do teu peito deitei a minha cabeça e imaginei que juntas conseguiríamos sobreviver a todos as crenças. Assumi que me libertarias dos meus medos. Acreditei que deste naufrágio sairia vida.
Vi-te levantar voando, sem qualquer som a acompanhar. Os teus cabelos passaram-me pela face e escorregaram-te pelo seios. A luz rendeu-se em afectos às formas do teu corpo. Descobri novas cores nesse segundo.
Vivi-te hoje pela última vez e foi como se uma espécie de fogo me limpasse de todas as ameaças que vejo nos meus sonhos. Tu eras tudo o que eu queria.
Fiquei a ver-te pela janela até desapareceres através da chuva. As gotas da água espalhadas pelo vidro, dividiram-te em mil pessoas. Mil pessoas que ficaram aprisionadas na minha janela até vir o Sol que as evaporou.
Hoje sou mais eu por tua causa.

foto by laycos


Today I woke up with a feeling that I will not see you again. And a long time will pass until this impression of our everything, it was not more than this time that as already ended.
It's so easy to be wasted on you and live moments of total surrender to your feminine beauty. Find paths with my fingertips, through your skin white as the light and to lose the senses on your smooth middle.
I want to keep the warmth of your breath until I faint. Let me starve before I take my lips off from your mouth. After all that I left behind, I can not let anything escape from what I have of you. I'll drink you all at once as water and even the air will smell on you.
I want to die all the moves that keep me away from us. Erase all doors that close when you leave the room.
I want to feel this immensity of sensations that hurt my pleasure until I'm sure I have not lost anything of you. I will pray for the first time and ask that the memories that I have, linger even after you cut the cord that binds us to each other.
In your body I met mine.
In the shadow of your chest I laid my head and imagined that together we could survive all beliefs. I assumed you would free me from my fears. I believed that life would come from this shipwreck.
I saw you fly up, with no sound at all. Your hair passed over my cheeks and slipped down your breasts. The light surrendered in affections to the forms of your body. I discovered new colours in that second.
I lived you for the last time today and it was as if a kind of fire cleansed me of all the threats I see in my dreams. You were everything I wanted.
I watched you out the window until you disappeared through the rain. The drops of water scattered on the glass divided you into a thousand people. A thousand people who were imprisoned in my window until the sun came that evaporated them.
Today I am more because of you.



segunda-feira, 29 de janeiro de 2018


Quando vivo a verdade não há nada que se lhe compare. Algo desperta em mim e todo o meu corpo estremecesse num segundo interminável. E nesse momento espásmico, há uma luz que surge e ilumina todo o meu ser de uma forma alucinante e precisa. Como se um raio me atravessasse, na sua viagem fulminante entre a vida e a morte. Vivo no corpo a sensação desse fenómeno que me atravessa com precisão de um punhal e se por uma lado sinto o gelo acutilante do metal, por outro é como se a perfeição, ela própria, encarnasse no meu corpo e nada mais existisse, para além daquele momento, que me parece uma vida inteira.
Pergunto-me muitas vezes se sigo realmente o meu coração, se deixo que ele seja efectivamente o Senhor da minha vida. - É minha convicção pessoal que se o ouvir, vivo em verdade plena. E nessa linha, questiono-me, que verdade é esta? O que significa viver segundo a verdade? Será que é o mesmo que dizer, vivo aquilo que é bom para mim? E como sei se é realmente o melhor para mim?
Há uma pessoa sábia que me acompanha e me disse um dia, que a minha verdade talvez seja tomar atenção às minhas necessidades…
Na realidade, não posso afirmar com certeza que as decisões que tomo na vida e os passos que dou, são os melhores para mim. E até entro em grande debate interior sobre o assunto, não me demoro é muito em preocupações com as consequências. Uma vez tomada a decisão, sei que o caminho é para a frente. Honestamente, inquieto-me por viver segundo esta verdade e quando me sento em silêncio, apercebo-me muitas vezes dela, porém nem sempre a sigo. 
Caminhar ao lado do meu coração, não significa o gozo e o contentamento a todo o momento, como gostaria de sentir. Por isso escolho ouvi-lo, sim, porém tenho de confessar que só por vezes decido em consonância com o que dele me vêm, pois não me consigo sintonizar sempre com a sua verdade. Não se pense que é algo automático, ao contrário, exige muito treino e coragem… e nem sempre a tenho. 
Há dias em que me vem um sentimento de vazio interior, como se nada fizesse sentido. Sinto um peso que se assemelha ao arrependimento de algo que preferia não ter vivido e nessa altura fico perdida. Como se no meu estômago habitasse de repente uma fome insaciável. E nestes momentos fico insegura e assustada e só me apetece sair do meu corpo para não sentir. Sei no entanto, contrariada, que vivendo essa dor, ela me fará perceber que a verdade do meu coração não significa adquirir a eterna felicidade. Viver esta verdade significa, acima de tudo, podermos viver em ligação absoluta com o divino. …Talvez seja aquilo a que chamamos de “o significado da vida”... 
Honestamente não sei. Sei apenas que quando sou verdadeira comigo, mesmo que me doa, vem-me uma espécie de sensação de dever cumprido, algo que me transcende e que é ao mesmo tempo, todo o meu Ser. Sinto que vivi um momento em perfeição. É como se visse uma fera à minha frente, da qual tenho um medo terrível e quando a olho profundamente, realizo que afinal essa fera sou Eu e que não havia nada do que sentir medo.
Viver em pura verdade, pode ser então o que nos conecta com o que nos faz realmente sentir vivos e isso com tudo o que viver significa. Ou seja, viver as alegrias, a dor, a saudade, o êxtase, a morte, o desespero, a abundância, a felicidade, o choro e o riso, viver no medo ou no limite, na fuga ou no amor. 
Quando me surge, no meio da minha vida feliz, um sentimento de profundidade e o meu corpo escurecesse, por momentos assusto-me. Tenho quase o impulso de fingir que estou a sentir outra coisa qualquer, que não este assalto à minha felicidade. E pergunto-me, que intruso é este que também me acompanha na busca pela minha origem interior? Que nota é esta que me contrai, que me desafina e desatina e me faz descer o tom?
E nessa altura, puxa-me uma mão que me traz de volta e com ela chegam todas as pessoas da minha vida, todo o calor que elas me fazem sentir, todo o carinho e profunda gratidão por estarem na minha vida e por permitirem que continue na delas. 
Viver esta minha verdade dá-me espaço para ser grata pela minha mãe, pela minha irmã, pelo meu sobrinho, pelo meu irmão e sua mulher, a mãe que carrega dentro de si o meu novo sobrinho, sou grata pelo meu pai. Ser grata pelas minhas grandes amigas e amigos e pelas pessoas que vou conhecendo e que não esqueço. A minha verdade é um pouco de todos e vivo sempre com muito amor, a alegria de vos ter sempre comigo, mesmo que neste momento seja para lá deste oceano. 
Sei agora o que é estar longe, bem longe daqueles que gostamos, sem conseguir transformar estes oito mil quilómetros em oito minutos. E se por um lado é tentador ceder à tristeza de não vos poder abraçar e tocar a esta distância, por outro, apercebo-me do Poder que é realmente amar-vos desta forma inesgotável e sempre presente. Tomo consciência que esta energia atravessa realmente todas as montanhas, selvas e florestas, combate tempestades e furacões, percorre mares e rios, escapa ao tempo e desconhece a noção de espaço. Apenas existe cheia de luz e calor dentro de mim. 
Encho-me de alegria de vos sentir cá dentro, plenos de vida, como se fossem um coração sempre a bater e uns pulmões sempre a respirar. Sinto-vos todos os dias, sem me cansar, em eterna rotina e puro prazer. Fico com a certeza que o amor que sinto está para lá da distância.  
De novo confio que viver em verdade é na realidade viver o amor por mim e por vocês, meus queridos mais queridos e amados.


Amo-vos para além de mim e sou muito muito feliz por saber que vos tenho. De verdade, de verdade, infinitas vezes de verdade.

quarta-feira, 20 de setembro de 2017

Momento dos porquês...

Temos tantos recursos neste momento. A internet que nos permite falar uns com os outros, mesmo que estejamos em lados opostos do mundo. Transportes tão rápidos que nos levam aos quatro cantos do planeta, em menos de um dia. A ciência que nos prolonga a velhice e inventa vida aonde não era suposto. Que nos explica como funcionam os vulcões e nos avisa dos tornados e das tempestades.
E tudo isto faz sentido e de certa forma até nos ajuda... Mas pergunto, então porque é que nos intoxica?
Andamos à procura de um propósito de vida e por outro lado fazemos um esforço terrível e diário para acreditarmos que não precisamos de nenhum. 
Fazemos terapia para deixar de ter medo e nos tornarmos mais humanos, enquanto lutamos uns contra os outros e nos aterrorizamos com a solidão.
Uma multidão é “inverdadeira" e como seres únicos que somos, temos a possibilidade de ver a nossa essência. Não precisamos realmente de ninguém para estar bem ou ser felizes e ao mesmo tempo é em conexão uns com os outros que nos vemos verdadeiramente. Já li algures, "quem quer chegar depressa vai sozinho, quem quer chegar mais longe, segue com os outros".
Temos toda a polaridade do "bom" e do "mau" dentro de nós e ao mesmo tempo negamos constantemente do que somos capazes, quer para o "bem", quer para o "mal".
Somos uns estranhos para os outros e para nós próprios. Alguém se apresenta ao senhor aonde compra flores ou o pão de todos os dias? E alguém se dá a si próprio os bons dias? 
Por vezes são tantos os porquês. Porquê passar a maior parte da vida a correr? Para quê fugir sem sabermos bem do quê? Para quê dizer a verdade, se a verdade é aquela que está dentro de nós? E se a vivermos cá fora, não precisaremos de a dizer, certo? Para quê preocupar-me em meditar todos os dias, se continuo a sentir a dor de todos os dias? 
Os porquês surgem-me e por vezes azucrinam-me. No entanto e porque acredito que tudo É por um motivo, procuro respostas... e às vezes elas vêm.
Talvez porque sinto que se não meditasse, a dor continuaria sempre muito profunda, inalcançável. E sabendo a diferença, sei que pior seriam as dores se não as meditasse.
Talvez porque há sempre alguém que se importa. Talvez porque quem pergunta quer realmente saber. Talvez porque estamos sempre a aprender uns com os outros. Talvez porque existe a luz em todos nós. Talvez porque acreditamos que o melhor ainda está por vir.
Somos este Ser único no meio de outros sete biliões e é precisamente nesta multidão que nos inspiramos a ser diferentes. Vemos aqui, para além do ali. Seja lá o que isso for…
É neste oceano de pessoas e sensações que o nosso Ser desperta para o Divino. 
É neste mistério que ansiamos, sem nenhuma explicação lógica, pela comunhão com o que é belo e aparentemente inatingível ou intocável. 
É aqui que nos sentimos sozinhos e é aqui que procuramos e sentimos o amor, na mais profunda e deliciosa desarmonia. 
É aqui que estou e quero Ser. É aqui que aprendo a Ser comigo e a estar com todos e contigo.

english version (I ask for your understanding about my mistakes):

Why Moments...
We have so many resources right now. The internet that allows us to talk to each other, even if we are on opposite sides of the world. Transports so fast that can take us to the four corners of the planet in less than a day. The science that prolongs old age and invents life where it was not supposed to. That explains how the volcanoes work and warns us of tornadoes and storms.
And all this makes sense and in some ways even helps us ... But I ask, then why does it intoxicate us?
We are looking for a purpose for life and on the other hand we make a terrible daily effort to believe that we do not need any.
We do therapy to stop being afraid and become more human as we struggle against each other and terrify ourselves with loneliness.
A crowd is "untrue" and as unique beings we are, we have the possibility to see our essence. We don’t really need anyone to be well or to be happy and at the same time it is in connection with each other that we truly see ourselves. I read somewhere, "whoever wants to go quickly goes alone, who wants to go further, follow with others".
We have all the polarity of the "good" and the "bad" within us and at the same time we constantly deny what we are capable of either for "good" or for "evil."
We are strangers to others and to ourselves. Does anyone ask the name of the flower men or the bakery lady where we daily by our brad? And does one give himself the good days?
Sometimes there are so many whys. Why spend most of your life running? Why escape without knowing what? Why tell the truth, if the truth is that which is within us? And if we live that same truth outside of us, we do not need to say it, right? Why bother to meditate every day, if I continue to feel the pain of every day?
The whys come to me and sometimes they really get me mad. However and because I believe that everything is for a reason, I seek answers ... and sometimes they come.
Perhaps because I feel that if I didn't meditate, the pain would always remain very deep, unreachable. And knowing the difference, I know that the pain would be worse if I did not meditate.
Maybe it’s because there is always someone who cares. Maybe who question really wants to know. Maybe it’s because we're always learning from each other. Maybe there is light in all of us. Maybe we believe the best is yet to come.
We are this unique being in the midst of another seven billion and it is precisely in this crowd that we are inspired to be different. We see here, beyond there. Whatever that is ...
It is in this ocean of people and sensations that our Being awakens to the Divine.
It is in this mystery that we yearn, without any logical explanation, for communion with what is beautiful and apparently unattainable or untouchable.
It is here that we feel alone and this is where we seek and feel love, in the deepest and most delicious disharmony.
This is where I am and where I want to be. This is where I learn To Be with myself and to be with everyone… and with you.

segunda-feira, 10 de abril de 2017

A árvore que Somos...


Sai hoje de um retiro de dez dias. Dez dias de muito trabalho físico e interior. Não sei com honestidade dizer qual dos dois o mais difícil... bem na verdade o físico passará depois de uma boa noite de sono no ninho, já o outro terá efeitos muito mais duradouros. 
Curiosa a força com que o nosso inconsciente se faz sentir. Cada emoção, cada sentimento de dor, a nostalgia da saudade, o sabor amargo da desilusão, a dúvida, todos se manifestam fisicamente. 
Reparo que na quietude da meditação o silêncio fala. 
A agitação abraça-me o corpo todo... e eu deixo. Estou em lotus embora em águas agitadas... e aceito.
É nesta ausência absoluta de movimentos que me apercebo que não tenho ouvido o meu grande mestre, o comandante do meu barco... o meu corpo. 
Permiti que alguns dos meus hóspedes me visitassem durante este retiro e foi muito bom deixá-los habitar-me sem espaços definidos. Senti-los gladiaram entre si a minha atenção e eu com tempo para os arrumar e mediar. Tenho esperança que alguns deles me tenham abandonado para sempre, abrindo a porta a outros, que me trazem novas qualidades para continuar a desbravar caminho.

Todos trazemos connosco memórias e acontecimentos que nos marcam e nos ferem. Uns largamos, outros guardamos bem no fundo de nós. São como raizes de uma árvore, agarram-nos à terra, crescendo na cegueira da escuridão. 
As raizes alimentam-nos e no entanto rasgam-nos, magoam-nos, dilaceraram-nos, matam-nos de alguma forma para nos fixarem ao chão. 
... Por vezes é tão duro criar raízes. Temos tanto para viver, tantas oportunidades para partir, tantos caminhos para seguir sem olhar para trás, tanto por descobrir. Como é bom termos este tempo para nós, para nos apercebermos que ter terra é por vezes o que nos salva e nos trás de volta à realidade. É o que nos permite recomeçar de pé.

A vida é fascinante por tantas coisas. Uma delas é, com certeza, o podermos optar por deixar sair, daquelas raízes escondidas, escuras e desconhecidas, a árvore magnífica e livre que Somos. 
Disse-me o coração, a árvore sustenta o corpo, não a Alma... Penso que ele queria dizer-me que podemos escolher encher a nossa árvore de ramos fortes, cheios de contornos e folhas verdes brilhantes, pintá-la com infinitas flores bonitas e encantadas. 
As raízes dão-nos a benção de renascer e o poder de Viver e a árvore é muito mais do que apenas aquilo que nos agarra à terra.

 A mãe terra suporta-nos e alimenta-nos, não nos aprisiona, é uma parte de nós. Somos livres de procurar a luz e de querer sentir o vento, a chuva e o calor. Somos livres de olhar para cima e desenhar as nuvens. Temos uma força independente que nos liga também ao céu e ao sol e nessa dualidade perfeita podemos transformar a nossa árvore num Ser livre, forte, corajoso, poderoso. 

Carl Jung disse: ” qualquer árvore que queira tocar os céus precisa de ter raízes tão profundas a ponto de tocar os infernos”.

...É amando as nossas raízes mais profundas e negras, que nos conseguimos transformar na árvore mais forte e mais bonita... 

sábado, 25 de junho de 2016

Estrelas a rodopiar no bosque.

Aqui deitada no chão, vejo as nuvens a fugirem da noite e a noite a engolir as nuvens. As árvores tombam e levantam, tombam e levantam infinitas vezes numa dança que dura até que o vento pare. 
Aos poucos, o negro profundo do universo domina a luz. O azul vai-se perdendo do céu e foge para dentro do outro lado do mundo, para onde foi também o Sol. Enquanto isso, a Lua nasce nas minhas costas, não sei exatamente aonde e apesar da curiosidade prefiro ficar aqui, cega da sua luz, cega de pensamentos, de olhos bem abertos para o azul que ficou negro... Desta vez não quero fechá-los...
A terra sobe-me pelas veias e ao mesmo tempo escapa-me por entre os dedos abertos contra o chão. Sinto arrepios de frio enquanto ela me envolve e me energiza. Está em todos os lados, nos meus cabelos, no meu peito, no meu ventre. Imagino as minhas mãos perfurarem a sua crosta como raízes. Sinto-a húmida como as palavras que ecoam em solavancos acima de mim. Alguém as diz. Por vezes tocam-me, por vezes não as oiço, mas gosto que elas estejam por ali...
Deixo-me estar assim, morta para os outros e a ferver de sentimentos por dentro. Vejo tudo e sinto tudo e não me movo. Não quero. Escolho render-me, segura pelas guardiãs que continuam a tombar de um lado para o outro, porque o vento não acabou.
Quando em obediência à voz que nos guia, me levanto cheia de toda esta beleza, dou com os pirilampos que voam em soluços luminosos à minha volta. Por momentos imaginei que todas as estrelas do universo tinham vindo para dançar comigo. Só pode ser magia, pensei. Estrelas a rodopiar no bosque.
E nesse instante há uma mão que me toca, um braço que me envolve, um olhar que me foca. E quis tanto partilhar aquele sentimento que me expandia cada vez mais, que me fundi num abraço, primeiro a dois, depois a três, depois a quatro e depois perdi a conta. Já não era apenas eu. Éramos... Éramos esta corrente de vida.
E assim senti a nossa cerimónia secreta de adoração à mudança de estações. De adoração ao Sol e à Lua. De adoração à união do Ser com o Outro. A minha alma sintonizada com o Todo, porque senti o Todo em mim.

sábado, 4 de junho de 2016

Fragilidade


Fragilidade...
Quando sinto tudo através do amor, vem uma grande sensação de abertura, uma vibração que se expande dentro de mim e explode para fora, sem deixar de estar cá dentro. 
Sinto os braços esticarem e a ficarem braços que abraçam tudo o que a minha vista alcança, mesmo que tenha os olhos fechados. 
Sinto o peito tão grande que caberiam em mim todos os corações que eu quisesse, mais as estrelas, a lua e nem o sol rebentaria comigo.
E quanto mais fico nesta vibração amorosa, mais sinto esta sensação de choque eléctrico que me endireita os cabelos na direção do céu. O ar quase que falta nos pulmões e a boca abre-se de espanto, na busca de respirar com mais força.
Tenho agora mil corpos que querem ir a todo o lado, que são as árvores, as nuvens, os pássaros, a chuva que cai e inunda tudo, o calor, o frio. Sinto tudo.
Vivo absolutamente no Presente.
E nesta espiral de sentimentos, de repente estou tão, tão, tão  aberta que não poderia estar mais... frágil. 
Estou a sentir tudo pelo amor e o que ele me trás é fragilidade!
Sinto medo? Espanto? Um aperto?... Da expansão sou sugada para um espaço comprimido, tão comprimido que nem o sinto...
A inevitabilidade do amor é a fragilidade. E esta só existe no amor. Que descoberta assombrosa esta.
... E é isto a vida? Esta abertura sem espaço. Esta dimensão misteriosa que me puxa e me coloca num abismo que me atrai ao invés de me assustar. Esta medida, este comprimento, esta largura que me une, que me isola. Esta equação que me aumenta e me desintegra no mesmo segundo. Esta grandeza sem proporções e que na sua transcendência me condiciona.
Quando sinto tudo através do amor, sou fragilidade em carne viva, sem pele ou proteção. Assim é o amor... que deus me valha!

sábado, 17 de outubro de 2015

Homenagem a algo que me transforma...

Quando entramos na sala entramos descalços. E aos poucos também nos vamos desnudando. Desnudando do trabalho, do que ainda ficou por fazer, da azáfama, da poluição sonora sempre a zumbir à nossa volta, do telemóvel, da raiva, das frustrações... do cansaço... E aos poucos começa. Começa a danza...
Danzar descalça. Viver desde o cumulo da liberdade até ao extremo de nos sentirmos encurralados nos nossos próprios medos... e é a danzar que lhes damos baile.
As vivências são todas aquelas que temos direito e também as que não temos. O nosso processo é de todos, pois também é no Outro que nos encontramos. As emoções rodopiam em espirais lentas e nesse giro centrado voamos e ascendemos até ao mais alto de nós.



Danzar descalça e sentir-me nua... nua de pele, de contornos, de preconceitos, de ideias, de membros, de julgamentos. Agarrar o Outro de olhos fechados. Agarrar o Outro de olhos nos olhos. Aqui não há diferença física, há respeito pelos órgãos femininos e masculinos. Sou e sinto-me sensual. Sou e sinto-me sensível. Tocar e ser tocada no mais fundo do meu Ser, numa Sexualidade sagrada e sem tabus.
Danzar descalça começando de Dentro para o todo, como se o todo fosse Eu. Ir de copo cheio, livre e sem limites e voltar cheia daquela vibração expansiva do universo divino. Sentir-me sublime. O meu espírito em exaltação, o meu corpo solto num abraço planetário e a minha mente lúcida e cheia de vontade. A Transcendência liberta-nos de fronteiras.
Danzar descalça com tudo. Com as mãos, com as pernas, com os dois pés desencontrados e encontrando-se, cabelos no ar com os caracóis a voar despenteados para trás. Sou árvore , Sou lua, Sou um oceano, sinto o vento a soprar dentro de mim. Percorro enérgica a polaridade emocional e com o corpo, a mente e a minha natureza orgânica vou... vou num segundo intemporal, ardendo em Vitalidade e transformação.
Danzar descalça desenhando as ideias no chão e no ar, com os dedos todos, com os tornozelos, com o nariz, com as orelhas e as coxas. Colorir o tecto com as lágrimas que me caiem do pensamento. Ouvir uma orquestra com mil músicos escondidos debaixo de guarda chuvas com o céu pintado no resguardo. Imaginar que saltamos das janelas a voar, como se a gravidade fosse apenas uma invenção da nossa Criatividade.
Danzar descalça no meio de uma tempestade de emoções, sem precisar de gabardina ou carapuça, sem me esconder ou proteger, porque o único risco que corro é escorregar nos braços do Outro. Aqui o meu corpo serve de palco aos meus sentimentos, pelos braços sai a alegria, pelo peito o amor, pelas mãos a amizade, pelo olhar a verdade. Num ímpeto contínuo percorro a sala descalça e lanço toda a minha Afectividade.
E assim a danzar descalços, depois do êxtase, do apaziguamento, depois de termos permitido que o corpo seja realmente um instrumento e a casa das nossas emoções, encerramos as odes numa roda lunar ...ou solar...
bem integrados.
 Claro que já perceberam que não estou a falar apenas de uma aula de biodanza. A aula é só uma faísca. Acontece que é uma faísca que acende a lareira... E a minha fica bem acesa depois de danzar :)